Desde a eleição de 1988, a primeira com voto popular após o
fim do regime militar, uma coisa era consenso no mundo político. Para se vencer
uma corrida eleitoral, era necessário e indispensável ter tempo de propaganda
na TV e no rádio, para assim, difundir propostas e evitar o crescimento de
adversários.
Em 2018, 30 anos depois, tudo isso veio abaixo. A eleição
foi marcada pelo avanço das mídias sociais, como o Facebook, Twitter, Instagram
e, sobretudo, o Whatsapp.
O aplicativo de mensagens instantâneas que está presente nos
celulares de mais de 120 milhões de brasileiros, segundo dados da própria
empresa, foi amplamente utilizado por campanhas eleitorais, gerando polêmicas e
discussões sobre a legalidade do uso da plataforma.
O assunto ganhou o debate público após reportagem do jornal
Folha de S. Paulo, que apontou para a suspeita de que empresários impulsionaram
disparos por WhatsApp contra o PT na campanha eleitoral.
A reportagem levou o corregedor do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE), ministro Jorge Mussi, a abrir investigação sobre a compra de
disparos de mensagens via aplicativo.
Na época, a presidente da missão de observadores da
Organização de Estados Americanos (OEA) para as eleições brasileiras, Laura
Chinchilla, se manifestou sobre o assunto, relatando as complexidades de se
realizar uma investigação no WhatsApp.
“O fenômeno que estamos vendo no Brasil talvez não tenha
precedentes, fundamentalmente por uma razão, porque diferente das campanhas
eleitorais de outros países do mundo, as Fakes News estão se propagando, no
caso do Brasil, através de uma rede privada que é o WhatsApp. É uma rede que
apresenta muitas complexidades”.
A utilização do WhatsApp como instrumento de campanha não é
tão nova assim, mas o que ocorreu em 2018 pegou a maioria dos analistas de
surpresa, inclusive estrategistas de campanha.
A legislação eleitoral brasileira, que tem sido reformulada
a cada dois anos, é considerada muito restritiva. E, para muitos, a regra não
ficou clara justamente à respeito da utilização do WhatsApp.
O professor de direito eleitoral Filippe Lizardo, do
Instituto de Direito Público de São Paulo, explica que o uso do aplicativo
estava liberado, desde que respeitada algumas restrições.
“O Whatsapp ele pode, sim, ser utilizado como mecanismo de
veiculação de propaganda eleitoral. Desde que isso seja realizado pelo próprio
candidato, partidos ou coligações, e desde que os endereços para os quais as
mensagens serão enviadas tenham sidos cadastrados previamente pelos candidatos
de forma gratuita. Ou seja, eu não posso contratar uma empresa para que ela,
utilizando o banco de dados dela, retransmita mensagens e publicidade de um
candidato ou outro. Isso é vedado pela legislação eleitoral”.
A proibição da compra de banco de dados com números
coletados por terceiros, só permitindo o uso das listas reunidas pelos próprios
candidatos, partidos e coligações com os números cedidos de forma voluntária,
cria um embaraço difícil de lidar. Para alguns, isso poderia inclusive impedir
ações de assessoria de imprensa e consultoria.
Filippe Lizardo, no entanto, rechaça que situações como
essas possam acontecer.
“Uma coisa é você contratar uma empresa para fazer uma
comunicação, uma interface com os órgãos de imprensa. Isso não caracteriza,
necessariamente, uma propaganda eleitoral. Então, nesse ponto não há proibição.
A proibição, a vedação, é você contratar uma empresa para que ela use o mailing
dela para fazer uma divulgação da campanha eleitoral do ponto de vista da
propaganda eleitoral, ou seja, pedir votos para um determinado candidato, ou
falar mal de um outro candidato. Isso é proibido, são coisas distintas”.
Lizardo ressalta, porém, que para as próximas eleições, a
legislação precisa ser aprimorada, levando em conta as experiências vividas em
2018. Segundo ele, o mundo digital, que já tomou conta da corrida a cargos
eletivos neste ano, será intensificado nos pleitos futuros.